“Como vivermos outro Tríduo Pascal no ‘novo normal’”?

Vivemos um período quaresmal que coincide com uma crise. Muitos foram tocados pela ação do Coronavírus e, após um ano em quarentena, reafirmamos a nossa fragilidade. Perplexos, assistimos pelos noticiários a situação de desespero pela falta de insumos hospitalares e vacina. Parentes de pacientes e profissionais da saúde imploram por socorro!
Diante da ordem fique em casa, apresenta-se o problema do sustento das famílias, da manutenção das empresas, dos empregos e de políticas públicas insuficientes que prolongam o nosso sentimento de insegurança.
Ficar em casa, o que soava tão agradável, tornou-se um fardo para tantos. Algumas consequencias são perceptíveis: o aumento dos conflitos familiares, o desencadeamento de crises psicológicas, a queda do poder aquisitivo, dentre outros. E outras ainda serão notadas: desde os efeitos do isolamento, passando pela defasagem educacional e a alteração das relações no mundo do trabalho– a 5ª Revolução Industrial (marcada pelo estabelecimento da Era Digital).
No novo normal, ficar em casa, deixou de ser aquele tempo de graça (kayrós) ou de encontro entre aqueles que amamos. Sair de casa passou a ser uma aventura perigosa e o retorno para o lar provoca interrogações, tais como, (“Você se cuidou? Usou a máscara? Álcool em gel?”). As redes sociais que descontraíam se tornaram o principal instrumento de trabalho no lar. Alguns já inventaram um novo termo: zapphobia (pavor das redes sociais). Sobrecarregados, constantemente surgiam novas demandas na fria realidade do ensino e aprendizagem virtual. Pairava a recordação das aulas calorosas, dos encontros no Convento Espírito Santo, das celebrações de Páscoa e de Natal, das reuniões semanais com as irmãs e os professores e colaboradores.
Procuramos neste ano, como Colégio e Faculdade Sant`Ana, a nos adequarmos ao “novo normal”. Face à crescente contaminação provocada por uma mutação do vírus, a Instituição, com seus 116 anos de existência em Ponta Grossa, tomou uma decisão pioneira: ainda que o Governo do Paraná suspendesse as aulas presenciais “apenas” das escolas públicas, o Sant`Ana voltaria à modalidade remota por tempo indeterminado. Obrigado Sant`Ana pela decisão a favor da vida!
Após partilhar algumas percepções pessoais em meio à tragédia em que vivemos, acredito que somos convidados a refletir sobre a Semana Santa neste contexto.
Na Sexta da Paixão, quero me colocar ao lado de Maria e de João, contemplando Nicodemos descer o inocente da Cruz. São mais de 320 mil mortes no Brasil, cujas Marias e Joões ou Joãos acompanham o enterro de seus pais, filhos, irmãos, esposos, amigos, sem entender o porquê. Todos nós nos calamos diante da fatalidade! Por isso, no Sábado Santo, “quero ouvir o silêncio”: de José do Egito que foi vendido por seus irmãos; dos israelitas às margens do rio da Babilônia; de Jó que prefere se calar a amaldiçoar; de Maria que guardava tudo em seu coração; do Túmulo lacrado. Na dor da tragédia, Deus prova o nosso coração e nos convida à verdadeira conversão.
Reunidos com Maria no Cenáculo, os discípulos guardavam a esperança em silenciosa oração ao longo do Sábado. Também quero viver na esperança e quero a resposta para a minha oração: “Não vos assusteis! Vós procurais Jesus de Nazaré que foi crucificado? Ele ressuscitou. Ide, dizei a seus discípulos...” (Mc 16, 6-7). No entanto, outros já haviam perdido a esperança. Mesmo a estes Jesus se revelou na Palavra e na Eucaristia! (Lc 24, 13-33).
Enfim, constatamos que os católicos brasileiros valorizam muito a Sexta-Feira da Paixão. Em tempos normais, seria o dia em que as igrejas católicas estariam lotadas e multidões acompanhariam as procissões. No Domingo de Páscoa, temos “normalmente” uma participação menor em relação à Sexta-Feira Santa.
Neste novo normal, poderemos viver o luto do Sábado Santo a partir de três atitudes: o Silêncio, a Esperança e a Oração. Que possamos nos preparar para o encontro com o Ressuscitado. Que estejamos firmes como Maria, João e os discípulos, em nossas casas – o novo Cenáculo – para merecermos o Espírito Santo e anunciarmos como “o discípulo mais amado”: “a Vida manifestou-se e nós a vimos, e somos testemunhas, e a vós anunciamos a Vida eterna” (1Jo 1, 2).

Reinaldo Milek Marques (reimilek@gmail.com). Professor no Colégio e na Faculdade Sant`Ana (Ponta Grossa – PR). Formado em Filosofia, Teologia e Letras. Especialista em Filosofia, Sociologia, Religião, Gestão de Conflitos e Psicopedagogia.